Muito se tem discutido sobre a necessidade de as igrejas locais
praticarem o claro ensino bíblico da disciplina de membros que se mostrarem
endurecidos e pecaminosos. Ananias e Safira (At.5), o imoral de 1 Cor.5 os
falsos ensinadores de 2 João 1:10-11, e o faccioso de Tito 1:10, estabelecem
clara convicção sobre essa doutrina. Textos é o que não faltam para assegurar a
escrituricidade do assunto.
Entretanto, dentro da cristandade plural dos nossos dias, ações
disciplinadoras têm perdido completamente sua eficácia, em razão de várias
igrejas e pastores receberem como membros àqueles que vêm excluídos de outras
comunidades co-irmãs.
O crente excomungado (apartado da comunhão) em uma igreja frustra o seu
próprio processo disciplinar transferindo-se para outra igreja local, que, o
receberá em sua comunhão, sem nenhum respeito pela ação disciplinar da igreja
da qual o crente em estado de excomunhão é oriundo.
O efeito de tal prática é desmoralizante para a Igreja de Cristo e para
os ministros do Evangelho. Já vi gente suspeitando que essa prática, em alguns
casos, tem em vista o aumento de receita financeira por parte do pastor que
desrespeita a decisão disciplinar de uma igreja co-irmã.
Os prejuízos causados por essa prática são muitos.
Primeiro: Torna trivial a prática de igreja desmoralizar igreja. Para
Calvino um dos propósitos da disciplina eclesiástica é “Preservar a honra de
Deus através da Igreja”.
Segundo: Promove o descaso da membrezia para com qualquer ação
disciplinadora por parte da igreja local. Os crentes sabem que, se forem
excluídos de sua igreja, serão recebidos por alguma outra ávida por números.
Fica perdido um dos propósitos da excomunhão, que é infundir na
congregação o temor do pecado (1Tim.5:20). O objetivo de “evitar a corrupção
dos piedosos” (Calvino), fica
completamente comprometido.
Terceiro: Promove o endurecimento do membro excomungado, que perde uma
das marcas mais importantes de um eleito que é um profundo respeito para com as
igrejas de Cristo.
A excomunhão tem dois propósitos claros:
1) “… foi instituída a fim de que sejam afastados e expulsos da
congregação dos crentes aqueles que, falsamente, simulando fé em Cristo, pela
indignidade da vida e licenciosidade desenfreada de pecado, nada mais são do
que um escândalo para a Igreja, sendo, portanto, indignos de se gloriar no nome
de Cristo”. (Calvino).
2) Mas a excomunhão é também um meio de forçar o arrependimento “…
embora a disciplina eclesiástica não nos permita viver com familiaridade com
pessoas excomungadas ou ter íntimo contato com elas (1Cor.5:11), todavia
devemos… pela exortação, ensino… (e) orações (pedir) a Deus para que elas possam (arrependidas) retornar a
comunhão da Igreja”.
Ao desrespeitar a ação disciplinadora de uma igreja co-irmã, o pastor e
a igreja recptora estão praticando uma ofensa ao Senhor da Igreja, pois
frustram um processo recomendado por ele e pelos seus apóstolos, que deve ser
exercido sobre pessoas endurecidas com, pelo menos, três objetivos:
1) “a fim de que eles não sejam contados entre os cristãos… como se a
Igreja fosse uma conspiração de malfeitores e homens notoriamente ímpios. 2) A
fim de que, por relacionamentos freqüentes, eles não corrompam outros pelo
exemplo de uma vida perversa. E 3) Para que possam começar a se arrepender
consternados pela vergonha…” (Richard de Rider
citado por Heber Campos Jr./Fides Reformata Vol.X nº1/2005)
Portanto “a liderança da congregação local faz bem em lembrar-se de que
o Senhor irá requerer de suas mãos
uma prestação de contas. (…) Aquilo que o membro disciplinado faz, torna-se
responsabilidade pessoal dele; aquilo que os líderes deixam de fazer é,
inevitavelmente, responsabilidade deles…” (L. de Koster).
Calvino distinguiu três marcas nos eleitos: “Confissão de fé, exemplo de
vida e participação nos sacramentos”, marcas que ligam visivelmente o
crente a igreja de Cristo. Martin Bucer, e os calvinistas depois de
Calvino, asseveravam que a disciplina eclesiástica é uma das marcas de uma verdadeira
igreja de Cristo.
Essas marcas só se tornam visíveis no contexto de uma igreja local
(visível). É no seu âmbito que o eleito faz declaração de sua fé, participa do
batismo e da ceia do Senhor, e é também ali onde ele é submetido a disciplina,
quando a marca de uma vida exemplar dá lugar a um endurecimento pecaminoso.
“Para o protestantismo, a igreja universal torna-se visível na
congregação local, é ali que o poder das chaves é exercido e a disciplina
administrada”.(L.deKoster) (Mt.16:19).
Se “Cristo governa a Igreja por meio da Igreja” (Ernest Kevan), o desrespeito praticado por pastores e igrejas que desconsideram as
ações disciplinadoras de outras igrejas, é desrespeito contra o governo de
Cristo.
As Igrejas e pastores que passam por cima de medidas disciplinatórias de
igrejas co-irmãs estão em completo desacordo com o Novo testamento. Não faria
sentido a Escritura ensinar a uma igreja local “… sobre a importância de
manter a integridade da Igreja ao lidar com pecado persistente na congregação” (Franklin Ferreira/Alan Myatt) e ao mesmo tempo não julgar a
insolência de uma outra igreja local que, abertamente, descredencia a decisão
disciplinatória de outra.
“Em Mt.18:15-20 Jesus disse que um irmão em pecado deve ser confrontado,
reprovado e excluído da igreja, caso não se mostre arrependido” (Teol.Sistemática Franklin Ferreira/Alan Myatt). Essa recomendação
perde totalmente sua eficácia, se os pastores não tomarem a firme resolução de
respeitarem as ações disciplinares de outras igrejas, praticando a troca de
cartas de transferências, E-Mail’s, telefonemas, enfim buscarem, junto a igreja
de origem o histórico de crentes que chegam.
Em caso de membros em situação de pendência disciplinar, recomendar que
retornem e resolvam as pendências existentes, e só então, recebê-los como novos
membros, nunca antes disso.
“Se os membros fossem aceitos nas igrejas baseadas
simplesmente nas declarações destes que desejam ser membros haveria grande
potencial para o mal. Pois então cada ‘Cristão carnal’ que tivesse sido excluído
de uma igreja por impiedade ou heresia, poderia simplesmente ir para uma outra
igreja, proclamando-se um cristão bom e espiritual, e teria que ser recebido
como um membro”. (Davis W. Huckabee).
O episódio envolvendo Ananias e Safira em Atos 5:1-11 nos ensina a
seriedade do pecado deliberado, enquanto 1 Coríntios 5:1-5 nos adverte para a
gravidade do pecado tolerado. A atitude de desrespeitar uma igreja de Cristo,
recebendo como membro uma pessoa excomungada pela mesma, desmoraliza a noção de
seriedade que se deve ter para com o pecado, enquanto rouba-se de uma igreja de
Cristo o respeito que lhe é devido.
“É uma triste verdade que muitas igrejas, em seu
zelo por números, põem de lado a disciplina das igrejas co-irmãs quando
propositalmente recebem membros excluídos de outras igrejas sem requerer que o
membro excluído corrija a sua situação com a igreja anterior”. (Davis W.
Huckabee).
É bom lembrar que, as verdadeiras igrejas estão
diante do Senhor, os que promovem tal prática desmoralizante, certamente
receberão severa reprovação dEle.
“… se cada igreja requeresse carta de recomendação
das igrejas co-irmãs antes de aceitar um novo membro, e somente fizesse exceção
a esta regra após uma completa verificação das circunstâncias… então
diminuiria, e muito, a destruição das igrejas por pessoas mundanas que se mudam
de igreja em igreja como andarilhos maldosos destruindo [ou contaminando] uma
igreja após outra…” (D.W.Huckabee).
Na verdade os pastores deveriam ser exemplos para o rebanho de Cristo no
cumprimento de 2 João 10-11 e não buscarem proveito numérico na desobediência.
“Não pode haver uma igreja sem disciplina eclesiástica” (Martin Bucer).
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