O que são os dons espirituais? (1)
As próximas três lições da revista Lições Bíblicas, da CPAD — adotadas principalmente pelas Assembleias de Deus em suas Escolas Dominicais —, abordarão os dons do Espírito Santo. Apresento aqui a minha modesta contribuição sobre o assunto.
Haja vista a alegação dos críticos das doutrinas paracletológicas de que a expressão “dons espirituais” não consta da Bíblia, iniciarei esta série fazendo um esclarecimento. De fato, a expressão contida na pergunta em epígrafe não aparece em 1 Coríntios 12.1 e 14.1,12. Mas o termo pneumatikon (literalmente, “espiritualidades” ou “coisas espirituais”) pode ser traduzido por “dons espirituais”, uma vez que esta tradução é respaldada pelo contexto imediato: “há diversidade de dons” (1 Co 12.4); “dons de curar” (vv.9,28); “dom de curar” (v.30); “procurai com zelo os melhores dons” (v.31).
“Dons”, em 1 Coríntios 12.31, é charisma, mas em 1 Coríntios 14.1 é pneumatikon. Apesar disso, os termos são perfeitamente intercambiáveis, à luz do contexto. Ambas as formas se referem aos dons espirituais. Estes fazem parte das ministrações do Espírito Santo na igreja e manifestam a glória divina.
Os dons espirituais edificam os crentes e atraem os pecadores. São capacidades, dotações sobrenaturais concedidas pelo Espírito Santo, com o propósito principal de edificar a igreja (1 Co 14.3,4,5,12,26; Ef 4.11-13). Através deles, o Senhor revela poder e sabedoria aos seus servos.
Há distinção entre os dons espirituais e o batismo com o Espírito Santo, também chamado de dom do Espírito (At 2.38; 10.45). Este é um revestimento de poder outorgado pelo Paracleto, enquanto os primeiros são as capacidades sobrenaturais decorrentes do tal batismo. Nesse caso, quem já fala em línguas, como evidência do aludido revestimento, deve buscar outros dons: “procurai com zelo os dons espirituais” (1 Co 14.1); “como desejai dons espirituais, procurai sobejar neles” (v.12).
Também há distinção entre os dons espirituais como manifestações esporádicas (1 Co 12.6-11) e como ministérios (1 Co 12.28). Os primeiros estão à disposição de todos os que buscam a Deus (At 2.39; Rm 11.29). Já os dons ministeriais são residentes nos servos do Senhor e dependem, evidentemente, da chamada soberana de Deus (Mc 3.13).
Todo crente fiel, batizado com o Espírito Santo, pode ser usado com o dom de profecia, por exemplo (1 Co 14.1). Mas nem todo crente pode ser um pastor, visto que este dom não é uma manifestação momentânea, esporádica, e sim um ministério outorgado por Deus (Ef 4.11).
De modo geral, todos os dons são dados à igreja para o que for útil (1 Co 12.7; 14.28). E, por isso mesmo, não devemos ignorá-los ou desprezá-los (1 Co 12.1; 1 Ts 5.19,20; At 19.1-7). É o Senhor quem nos concede essas dádivas, “segundo a graça” (Rm 12.6). E, como essas dotações são, primacialmente, para a edificação do povo de Deus (1 Co 14.26), não devem ser mal utilizadas, sem decência e ordem, no culto genuinamente pentecostal (1 Co 14.37-40).
Ciro Sanches Zibordi
Os dons espirituais, como manifestações momentâneas, esporádicas, à disposição da igreja, não devem ser confundidos com o fruto do Espírito. Na verdade, os dons e o fruto devem estar casados, visto que se completam.
Neste segundo artigo, conheceremos as principais diferenças entre as aludidas ministrações do Espírito Santo, quanto a: quantidade, forma de recebimento, origem, forma de manifestação, duração, momento do recebimento, qualidade e finalidade.
1. Quanto à quantidade. Os dons são muitos, e não apenas nove, como muitos pensam. Segundo a Bíblia, há diversidade de dons, ministérios e operações (1 Co 12.6-11,28; etc.). O fruto do Espírito também não pode ter as suas virtudes quantificadas. Quem afirma que são apenas nove os elementos formadores do fruto toma como base apenas Gálatas 5.22. Mas há várias outras passagens que tratam dessa doutrina paracletológica, como Efésios 5.9; Colossenses 3; 2 Pedro 1.5-9, etc.
2. Quanto à forma de recebimento. Os dons são repartidos para a igreja, coletivamente. O fruto é produzido na vida do crente.
3. Quanto à origem. Os dons como manifestações esporádicas vêm do alto sobre a igreja. O fruto manifesta-se dentro de cada crente espiritual.
4. Quanto à forma de manifestação. Os dons vêm sobre os crentes. O fruto manifesta-se em cada crente de dentro para fora.
5. Quanto à duração. Os dons como manifestações — e não como ministérios — são momentâneos. O fruto permanece na vida do crente.
6. Quanto ao momento do recebimento. Os dons espirituais manifestam-se na vida dos servos do Senhor a partir do batismo com o Espírito Santo, como vemos em Atos caps. 2, 10 e 19, especialmente. Antonio Gilberto afirmou: “O batismo é também um meio para a outorga por Deus dos dons espirituais — 'falavam línguas e profetizavam'” (Verdades Pentecostais, CPAD, p.64). Já o fruto manifesta-se no crente a partir da sua conversão (Ef 1.13,14).
Observação: como afirmei no artigo anterior, há diferença entre as manifestações esporádicas e os dons ministeriais. Os ministérios não dependem, necessariamente, do batismo com o Espírito. Já as ministrações momentâneas e sobrenaturais do Espírito para a edificação da igreja só vêm sobre quem já recebeu o revestimento de poder (At 2.1-4). Apolo era um pregador (tinha um ministério), mas não era batizado com o Espírito, ao contrário do também pregador Paulo (cf. At 18.24—19.6).
7. Quanto à qualidade. Os dons são perfeitos, embora muitos façam mau uso deles. O fruto precisa amadurecer. Esta ministração do Espírito ocorre gradativamente, de acordo com a disposição do coração do salvo. Trata-se do aperfeiçoamento espiritual.
8. Quanto à finalidade. Os dons são manifestações para edificação da igreja. O fruto tem como finalidade o desenvolvimento do caráter do crente. A igreja de Corinto era pentecostal (1 Co 1.7; caps. 12-14). Todos os dons, ministérios e operações do Deus trino tinham lugar ali (1 Co 12.4-6). Contudo, ela estava envolvida em diversos problemas (1 Co 1.10; 6.1-11; 11.18), pecados morais graves (1 Co 5), desordem no culto (1 Co 11.17-19). Os coríntios eram imaturos e carnais (1 Co 3.1-4).
Quando se dá ênfase apenas aos dons, em detrimento do fruto do Espírito, ocorrem na igreja dissensão, carnalidade, egoísmo, desordem e indecência. O partidarismo na igreja de Corinto decorria da falta de amadurecimento do fruto do Espírito (1 Co 11.18; 1.10-13; 3.4-6).
O termo “dissensões” (1 Co 1.10; 11.17) descreve a destruição da unidade cristã por meio da carnalidade. Em vez de gratidão a Deus, para promover a comunhão e “guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4.3), os coríntios se reuniam para o culto com espírito faccioso.
Em Corinto, havia muita carnalidade porque os crentes daquela igreja não priorizavam o fruto do Espírito (1 Co 3.1-3). Havia membros daquela igreja guiados e cheios do Espírito Santo (1 Co 1.4-9; Rm 8.14), mas muitos eram carnais (v.1). Carnal é o crente cuja vida não é regida pelo Espírito (Rm 8.5-8); que tem muita dificuldade de entender os assuntos espirituais (1 Co 2.14) e vive em contendas, difamações, etc.
Por não cultivarem o fruto do Espírito, os coríntios eram egoístas (1 Co 11.21). Na liturgia da igreja primitiva era comum a Ceia do Senhor ser precedida por uma festividade chamada de agápe ou “festa do amor” (2 Pe 2.13; Jd v.12). No entanto, alguns crentes, em vez de fortalecerem o amor e a unidade cristã antes da Ceia do Senhor, embriagavam-se.
Segundo a Bíblia, todos podem, no culto, desejar falar em línguas e profetizarem pelo Espírito (1 Co 14.5). Mas ela também nos ensina a exercer esses dons com sabedoria, ordem e decência (1 Co 14.26-33,37-40), a fim de que o nome do Senhor seja glorificado (1 Co 14.25), o incrédulo convencido de seus pecados (1 Co 14.22-25), e a igreja edificada (1 Co 14.26). Daí a necessidade do fruto do Espírito.
Ciro Sanches Zibordi
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